01 junho 2012

Gestão da Informação em Serviços de Saúde

Nos serviços de saúde não é metafórico afirmar que a informação é um aspecto vital, na medida em que as informações estocadas e geridas dizem respeito à informação e aos dados relativos à saúde dos pacientes envolvidos. Neste contexto, destaca-se a importância das NTICs na otimização da gestão da informação e do fluxo informacional, pelas características intrínsecas que envolvem a questão da informação em saúde.

As NTICs podem trazer inúmeros ganhos ao segmento da saúde. Em micro-escala, podem permitir que médicos tenham, por exemplo, acesso à informação sobre seus pacientes em tempo real. Em macro escala, as NTICs possibilitam o acesso à informação técnico-científica que contribuem para o desenvolvimento e a prática do profissional na área de saúde. Além disso, servem de apoio aos processos de tomada de decisão na planificação, formulação e aplicação de políticas públicas para a saúde, coadunando-se ao desenvolvimento econômico e social do país.

Avaliando o conceito de dado na área de saúde, observa-se que pode ser considerado como um elemento peculiar – idade, sexo, etnia, ou valores numéricos específicos resultantes de exames tais como níveis de triglicerídeos no sangue de determinado paciente, entre outros fatores – em um tempo específico (data do exame) (VIEIRA et al., 2000). Os autores destacam ainda que os dados em saúde permitem livres interpretações, pois, dependem dos conhecimentos prévios e experiência do interpretador.

O conceito de informação em saúde resulta da análise e combinação de vários dados, que podem levar a diversas impressões acerca do estado de determinado paciente ou de determinada população. VIEIRA et al. (2000) afirmam que a informação em saúde somente existe na interpretação dos dados que devem estar constantemente disponíveis e atualizados para permitir novas interpretações e evitar erros diagnósticos ou terapêuticos.

Em macro-escala, um exemplo de informação em saúde relaciona-se à mortalidade e desnutrição infantil de uma região ou camada da população, obtidas a partir de dados colhidos em uma determinada pesquisa. Em micro-escala, os dados presentes em um hemograma.

Vale frisar que a informação em saúde está também suscetível a múltiplas variáveis – o que reforça a importância de contextualização – e que quase sempre se refere a dados relativos à melhoria, ou manutenção, da qualidade de vida, ou ao óbito de indivíduos. É um dos principais recursos, senão o principal, que um médico necessita ter em mãos para o exercício profissional com eficiência e qualidade. O acesso ou não à informação, bem como à tecnologia (MOURA, 2004), pode representar o sucesso ou insucesso na adoção de práticas terapêuticas ou algum cuidado a ser prestado ao paciente.

Moraes (1994) define o Sistema de Informação em Saúde (SIS) como:
"conjunto de componentes (estruturas administrativas e unidades de produção) integradas e articuladas que atuam com o propósito de obter e selecionar dados e transformá-los em informação, com mecanismos e práticas próprias". (apud BISPO JÚNIOR; GESTEIRA, 2004, p. 06).

Sigulem (1998) enfatiza que a principal missão dos sistemas de informação eletrônicos é dar assistência eficiente e com alta qualidade aos procedimentos informacionais, tornando-os mais rápidos e eficientes. Sem um sistema adequado de informações eletrônicas, as organizações tendem a desembolsar ineficazmente recursos para criar, armazenar e recuperar informações dos pacientes. Entre outros desdobramentos, a ineficácia da gestão informacional se traduz na redundância de tarefas e no alto dispêndio de tempo na tomada de decisões.

AS APLICAÇÕES DA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO NA SAÚDE

Até a década de oitenta do século XX, predominava o registro das informações em saúde em papel, dificultando o armazenamento e acesso por médicos e outros profissionais da saúde (VIEIRA et al., 2004; CHEN et. al, 2000). Nos hospitais, consultórios e até mesmo nos laboratórios de análises clínicas, a resultante era um enorme volume de papel, de fichas, prontuários, exames e laudos, o que demandava espaços físicos portentosos para o arquivo e a armazenagem, tornando o acesso às informações registradas lento e/ou dificultoso.

Com o crescente desenvolvimento e uso das NTICs tem se otimizado a coleta, o armazenamento e a difusão de dados e de informações, que podem ser agrupados e organizados, agilizando a consulta para o estudo, a pesquisa e a terapêutica epidemiológica (CHEN et al., 2000). Segundo Sigulem (1997) o desdobramento do uso das novas tecnologias na prática da medicina é surpreendente, na medida em que "as técnicas não evasivas de produção de imagem, como a ultra-sonografia, a medicina nuclear, a tomografia e a ressonância magnética, alteram sensivelmente o processo de diagnóstico médico. Novos equipamentos de monitorização de pacientes, como videolaparoscopia e analisadores automáticos de eletrocardiogramas, fluxos sangüíneos e gasosos, globais e regionais, oferecem informações vitais que auxiliam o médico, seja no tratamento eficaz do paciente, seja no apoio à pesquisa". (SIGULEM, 1997, s/p).

De acordo com o autor, os sistemas de informação em saúde podem favorecer o processo de assistência à saúde e aumentar a qualidade da assistência ao paciente. São representativas as contribuições no processo de diagnóstico ou na prescrição da terapia, na inclusão de lembretes clínicos para o acompanhamento da assistência, na emissão de avisos – sobre interações de drogas, sobre tratamentos duvidosos e sobre desvios dos protocolos clínicos –, e na interconexão com laboratórios para o acesso rápido a exames, entre outras (HERSH apud SIGULEM, 1997).

"a Sociedade da Informação, nesta fase pós-industrial, exige que a medicina moderna seja orientada pela ‘qualidade’ o que implica, basicamente, o gerenciamento racional da informação. Como a medicina aumenta a sua complexidade (devido a novos métodos de investigação ou tratamento e à diversidade de organizações da saúde, como indivíduos trabalhando sozinhos, pequenas clínicas, ambulatórios especializados, hospitais secundários e hospitais de alta complexidade, componentes estes que, para adequado suporte ao paciente, necessitam trabalhar em conjunção), a informática médica é um agente indispensável para a descentralização e a integração. Ela ajuda a superar as limitações humanas de memória ou processamento de informações. Com a implementação das redes de comunicação, a informática ajuda a trazer o médico para mais perto do paciente (por exemplo, através da telemedicina) e facilita o acesso à informação necessária ao cuidado ótimo (por exemplo, através do acesso ao prontuário eletrônico do paciente, a bases de conhecimento, ao uso de sistemas especialistas, resultados laboratoriais ou à realização de trabalho cooperativo)". (DEGOULET & FIESCHI apud SIGULEM, 1997, s/p).

Vieira et al. (2000), por outro lado, assinalam que o tempo perdido com a documentação de dados em prontuários de papel é dez vezes superior ao tempo gasto para examinar os pacientes.
Outro estudo citado pelos autores demonstram que 10,3% dos erros médicos que conduziram a eventos adversos em pacientes hospitalizados resultaram do desconhecimento de resultados de testes e de achados laboratoriais. A literatura médica confirma a mesma probabilidade para a ocorrência do chamado “falso positivo” em exames, o que impele à indicação no próprio laudo de que sejam feitas investigações mais aprofundadas, mas nem sempre inteligíveis pelo usuário, considerando o uso de terminologia técnica (INVERTIA, 2005). Todavia, Moura (2004) aponta outros fatores concorrentes para o erro médico, entre eles, a baixa capacitação tecnológica dos profissionais em saúde.


Os sistemas clínicos, como os de apoio à decisão e os prontuários eletrônicos, devem ser ferramentas úteis na melhoria da qualidade do serviço e na redução de gastos. Porém é difícil quantificar os benefícios financeiros proporcionados (VIEIRA et al., 2000).


Sigulem (1997) aponta outras investigações sobre as necessidades de informação dos médicos durante o atendimento a pacientes em diferentes tipos de ambientes, ressaltando os contratempos da não informatização em saúde. O autor indica o levantamento de, pelo menos uma dúvida, a cada encontro do médico com o paciente.


Questiona ainda se a falta de informação, ou a dificuldade de acesso à informação, impacta de sobremaneira no atendimento ao paciente. Conclui que sim, ao referendar estudos que demonstram haver prescrição inadequada de medicamentos e de tratamentos em até 84% dos casos. Ressalta que um dos efeitos mais imediatos do acesso eletrônico às informações sobre o paciente é o aumento de segurança na obtenção da informação e a rapidez de se poder prescrever o tratamento adequado a cada caso.


Estando a informação necessária ao médico disponível instantaneamente, ou podendo ser impressa de forma resumida a partir do prontuário eletrônico, os erros tendem a diminuir consideravelmente. Neste caso, o problema passaria a ser a segurança no sistema e a disponibilidade de terminais para o acesso ao sistema.


A Tecnologia da Informação usada em um sistema de informação hospitalar tende a proporcionar confiabilidade, agilidade e racionalização de procedimentos, ou seja, resultados efetivos para as instituições da área da saúde.


Sigulem (1997) comenta que os resultados da introdução de um Sistema de Informação (SI) informatizado em hospitais auferem vantagens sobre o uso de prontuários de papel, pelo fato da tecnologia disponibilizar as informações necessárias em 99% das vezes contra 72%, quando o registro ocorria somente em papel.


Cumpre mencionar que são diversos os sistemas de informação em saúde disponíveis com base em NTICs. Entre eles estão os sistemas financeiros de atendimento, de administração, de telemedicina, os destinados à pesquisa, de informação em saúde pública, de educação médica e os de gerenciamento clínico. Sigulem et al. (1998) organiza esta diversidade, em caráter estritamente didático, conforme expresso a seguir.


§ Ferramentas para o tratamento da informação. SI que se destinam a organizar e facilitar a recuperação da informação médica. Os sistemas gerenciadores de consultórios e de laboratórios, os livros eletrônicos, os sistemas de auxílio à recuperação bibliográfica, como o Medline, pertencem a esta categoria.


§ Ferramentas de focalização da atenção. SI que monitoram dados através da emissão de alertas. O autor exemplifica relacionando os sistemas de interação de drogas e os sistemas de laboratório clínico que emitem avisos na presença de valores discrepantes daqueles esperados nos exames.


§ Ferramentas específicas para consultas. SI destinados a apoiar o profissional da saúde na área afim. Enquadram-se nesta categoria os sistemas especialistas de apoio ao diagnóstico.


O processo de incorporação das novas tecnologias da informação em saúde tem transformado uma antiga relação um-para-um (a relação médico-paciente) em uma relação um-para-muitos, na qual os dados podem ser produzidos não apenas no hospital, mas também na casa do paciente, no consultório, nos laboratórios de análises clinicas e em outras centrais diversas de realização de exames (VIEIRA et al, 2000; LOPES, 2004). O novo padrão de relacionamento interligado requer um maior compartilhamento de informações.


Vieira et al. observam ainda que "os sistemas de informação na área da saúde devam ser direcionados para o gerenciamento global das informações médicas e administrativas; nesse contexto, os principais objetivos desses sistemas ficam sendo a melhora da qualidade de atendimento e o controle de custos". (2000, s/p).


Contudo, apenas o desenvolvimento de ferramentas de gerenciamento de informações clínicas – registro computadorizado de pacientes, sistemas de apoio à decisão, gerenciamento de imagens médicas etc. – não é suficiente. A necessidade de eficiência exige que a informação médica esteja presente no local de atendimento e no momento certo para atingir a melhor resposta clínica, utilizando a menor quantidade possível dos (escassos) recursos disponíveis. Assim, o grande desafio no uso das NTICs é não apenas a criação de SI adequados, mas a interligação entre os sistemas.


Neste contexto, Vieira et al. (2000) assinalam que o atendimento de saúde não é exclusivo das instituições hospitalares. Em oposição ao antigo modelo “hospitalocêntrico”, cujos ambientes eram centralizados nos grandes computadores exclusivamente dessas instituições, os autores afirmam a necessidade de que “os diversos sistemas sejam abertos o suficiente para permitir a livre comunicação entre os diversos sujeitos que participam do atendimento à saúde” (VIEIRA et al., 2000, s/p). A busca da qualidade no atendimento, portanto, deve abranger todos os elementos da rede, sejam laboratórios de análises clínicas, sejam consultórios médicos particulares.


Assim sendo, a Internet se destaca entre as NTICs pelas múltiplas possibilidades que oferece. Nenhum meio de comunicação, até hoje, pôde propiciar, como ela o faz, uma “via” que torna praticamente disponível em qualquer lugar uma série de informações e serviços antes só presentes nos grandes centros. Das NTICs, a Internet é a que traz mais possibilidades para a questão da difusão da informação em saúde, por suas características próprias de interatividade e interconectividade – como discutido na primeira parte.


Entre outras facilidades, a Internet possibilita aos profissionais da saúde acessar, em qualquer lugar, milhares de bancos de dados em universidades e centros de pesquisa, ler jornais e revistas eletrônicos, comprarem produtos, trocarem informações e opiniões com colegas da área das mais diversas partes do país e do mundo, obter exames e se comunicar a distância com laboratórios, telemonitorizar aparelhos, enviar e receber correio eletrônico, além de veicular diversas informações sobre as mais diversas doenças e estado de pacientes.


Chen et al. (2000) aborda as vantagens e utilidades da Internet na área de saúde, que vão desde facilidades, como o prontuário informatizado do paciente, passando por informações relacionadas à gestão do serviço.


Outra vantagem trazida pela Internet, para a outra ponta da cadeia (no caso os pacientes), é que informação pode estar distribuída em múltiplos servidores e bancos dados. Um estrato de pacientes está familiarizado com as opções da Internet e pode, assim, usufruir das vantagens proporcionadas, o que torna a informação em saúde mais democratizada. Os pacientes têm, pois, a possibilidade de estarem mais bem informados, podendo avaliar e questionar as condutas médicas.

O PROCESSO DE INCORPORAÇÃO DE NOVAS TECNOLOGIAS NA SAÚDE

Por volta de meados dos anos 50 do século XX, nos EUA, iniciou-se a introdução de computadores na área de saúde direcionada à realização de análises médicas estatísticas, ao controle de material e da folha de pagamento (HANNAH apud SIGULEM, 1997).


Vieira et al. (2000) comentam que os primeiros sistemas de informação nos serviços de saúde foram desenvolvidos, porém, somente em meados da década de 1960. Seguia-se então a tendência geral de evolução nos sistemas de computação, com a implementação de arquiteturas centralizadas integrando todas as funções. Esse modelo era de grande utilidade para os administradores, uma vez que permitia o controle simples de toda a instituição. Os SI caracterizavam-se, primariamente, como gerenciadores de contas a pagar e de cobrança.


Em 1962 foi desenvolvido o primeiro projeto de informatização em um hospital nos EUA que, dado o êxito, foi rapidamente replicado pelo setor (SIGULEM, 1997).


A década de 70 representa um período de esforços contínuos para automatizar vários departamentos hospitalares e sistemas financeiros (PONTES et al., 2000). Devido à estrutura elementar do banco de dados e à onerosa do hardware, as iniciativas foram limitadas. Só no final da década de 70 é que surgiram os Sistemas Modulares, permitindo o compartilhamento dos entre diferentes módulos instalados. Segundo os autores, cada módulo continha elementos básicos de informações, entretanto não era possível fazer registros no prontuário do paciente.


O sistema não dispunha ainda de tecnologia para interligar equipamentos e sistemas dentro e fora da instituição, o que somente ocorreria na década de 80 através dos Sistemas Distribuídos, baseados na tecnologia de comunicação em rede que originou a Internet (PONTES et al., 2000).


O uso da Internet como ferramenta na saúde era praticamente um processo inevitável. O crescimento exponencial das técnicas médicas de investigação e de tratamento conduziu à reorganização dos serviços de saúde, visando o controle do custo e da qualidade de atendimento, redundando na necessidade crescente de maior compartilhamento de informações (LOPES, 2004). Apenas o desenvolvimento de ferramentas de gerenciamento de informações clínicas – registro computadorizado de pacientes, sistemas de apoio à decisão, gerenciamento de imagens médicas etc. – não se mostrava mais suficiente; o grande desafio passou a ser a interligação, a interconectividade e interatividade entre os locais de origem de dados com os locais de utilização (VIEIRA et al., 2000; SANTOS; BERAQUET, 2001).


Todas essas transformações refletiram-se na crescente demanda por NTICs iniciada em meados da década de oitenta do século XX. A necessidade de eficiência exige que a informação médica esteja presente no local de atendimento e no momento certo para atingir a melhor resposta clínica, utilizando a menor quantidade possível dos recursos disponíveis.


Vieira et al. (2000) defendem que o ritmo de instalação dos sistemas de informação, apoiados nas NTICs, nas organizações tem se revelado numa tendência crescente nos últimos anos. Os sistemas de informação vêm sendo incorporados à gestão do fluxo informacional gradativamente podendo-se prever a utilização em níveis cada vez mais elevados nos próximos anos. A introdução crescente e maciça da tecnologia da informação segue um curso inexorável.


Um estudo realizado por Dorenfast (1995, apud SIGULEM, 1997), abrangendo os 2.938 hospitais americanos com mais de 100 leitos, constatou que, já naquela época, 100% dos hospitais contavam com SI administrativos e 77,6% já possuíam algum tipo de gerenciamento clínico – geralmente pedidos de exames, resultados de exames e registro resumido dos dados de pacientes internados.


Lopes (2004) contata a emergência, por conseguinte, de um novo paradigma em saúde, no que se refere à manipulação da informação em todos os seus estágios, desde o emissor até o receptor. Para a autora, a Internet – a Web – constitui-se em um dos temas de maior repercussão em saúde, pois modifica a forma de acesso, produção e disseminação de informação em larga escala, revolucionando toda a estrutura em vigor.


Cumpre lembrar que no Brasil o acesso à tecnologia (de ponta) é privilégio de classes sociais mais elevadas. Mesmo as aplicações menos sofisticadas são de difícil e lenta apreensão pela grande parte da população, em função da existência de uma série de indicadores de subdesenvolvimento, como o analfabetismo, a má distribuição de renda e a precariedade da infra-estrutura dos serviços básicos, entre outros.


Em contraposição, na área de saúde a tecnologia é usada com muita freqüência – majoritariamente em hospitais, clínicas, laboratórios e consultórios particulares. Em alguns segmentos, como a medicina investigativa, de imagem ou laboratorial, faz-se necessário que o profissional esteja constantemente atualizado sobre as inovações tecnológicas e sobre as novas técnicas terapêuticas e de diagnose.


Uma representativa parcela de laboratórios e hospitais (e mesmo clínicas e consultórios) utilizam a Internet e a tecnologia de rede (Intranet) para conduzir eletronicamente os processos e trabalhos, conectando todas as instâncias dos procedimentos internos e entre si, de modo a facilitar e agilizar a troca de informações.


O uso crescente das NTICs no setor de saúde e, em específico no segmento de análises clínicas, não é porém, um processo uniforme. Algumas instituições ainda resistem à implementação, principalmente as micro e pequenas empresas (ALVIM, 1998).


Uma das dificuldades enfrentadas neste processo é, muitas vezes, o alto custo da informatização, associado à dificuldade de manejo – por haver um grupo restrito de pessoas com conhecimento necessário para o uso da informática –, e à resistência (cultural) em incorporar a informática à prática médica (SIGULEM, 1997).


Observa-se que o custo de um software, tanto para o desenvolvimento como para a manutenção, representa parcela crescente dos gastos em informática de uma organização e, algumas vezes, sobrepuja o valor de um equipamento (hardware). “O crescimento destes investimentos deve-se em grande parte à maior complexidade dos problemas a serem resolvidos e à maior exigência dos usuários” (VIEIRA et al., 2000).


Os autores ressaltam que os sistemas de informação na área de saúde têm sido revestidos de uma complexidade maior. Assim, perpassam a simples de função de controle financeiro, passando a colaborar no gerenciamento de toda a informação administrativa e assistencial no âmbito da organização, o que torna difícil a tarefa de se estimar os custos de instalação, operação e de se quantificar os ganhos advindos pela adoção da TI.

O SEGMENTO DE ANÁLISES CLÍNICAS E A GESTÃO DA INFORMAÇÃO

No Brasil, existem aproximadamente dez mil laboratórios de análises clínicas (BARBOSA, 2002 apud BECKER, 2004). De acordo com Maia Filho (2000), na Bahia, há cerca de 400, dos quais 65% estão na capital; seis mil profissionais atuam no segmento.


Os tipos de organização mais comuns são as pequenas e médias empresas. Em geral, assumem os cargos diretivos e técnicos das empresas deste segmento, médicos, biólogos e farmacêuticos (BECKER, 2004).


Como observa Sannazzaro (1998 apud BECKER, 2004), o segmento de análises clínicas (ou patologia clínica) surgiu e se desenvolveu junto com a própria medicina – as histórias de ambos se confundem. Originalmente, não se limitava a um “serviço de apoio” à medicina, como aparenta ser hoje, mas se tratava de procedimentos estritamente experimentais com o objetivo de descobrir elementos novos ou desconhecidos, sem direcionar as atividades apenas para fins diagnósticos.


Somente com os primeiros passos da patologia clínica, na segunda metade do século XIX, é que a ciência médica foi impulsionada nos laboratórios das universidades alemãs. As grandes descobertas da época – como o início da microbiologia; a descoberta dos componentes do sangue; o surgimento da citologia como auxiliar de diagnóstico, entre outras – transformaram não só a medicina moderna, como também reconfiguraram a função do laboratório de análises clínicas (SANNAZZARO apud BECKER, 2004).


Comprova-se que o desenvolvimento do segmento está intimamente relacionado ao progresso e consolidação da medicina. Igualmente, a crescente incorporação em saúde de novas tecnologias não pode passar ao largo do segmento de análises clínicas, que também sofre a influência e acolhe inúmeros recursos e novas técnicas graças aos avanços tecnológicos, como é discutido adiante.


O segmento de análises clínicas é uma das correntes da diagnóstico-terapia moderna, ao lado da bioimagem e da telemedicina. A atividade é cruzada por várias áreas das ciências biomédicas.
Sannazzaro reitera que "acerca da contribuição do laboratório para com a saúde do paciente e a comunidade, e nas expectativas dos clínicos, verificamos que o laboratório pode contribuir para (a) um rápido e correto diagnostico e daí dar início à terapêutica correta; (b) estabelecer prognósticos através do fornecimento de indicadores de níveis de severidade; (c) acompanhar a evolução ou regressão da doença, por meio dos dados que determinam a linha de base". (1998 apud BECKER, 2004).

Ogushi e Alves (apud BECKER, 2004) complementam que a essência da gestão qualitativa de um laboratório de análises clínicas é possuir um serviço no qual a informação que chega ao medico, ou ao paciente, na forma de laudo, satisfaça as necessidades do usuário.


Como ocorre a qualquer organização, a macro-estrutura que circunda um laboratório está sujeita a diversas forças e variáveis. Trata-se de um universo humano, social e econômico, cujo ambiente é constituído por variáveis tecnológicas, políticas, econômicas, legais, sociais e demográficas (SANNAZZARO apud BECKER, 2004).


Para a autora, esta ordem de variáveis não é aleatória. O trabalho de um laboratório de análises clínicas está, em primeiro lugar, baseado em tecnologia, somente depois vindo a ser complementado por fatores humanos. Por isso, afirma que a tecnologia influencia a estrutura, o comportamento organizacional e o modo de administrar a organização.


Compreende-se que o elenco de clientes de um laboratório é diversificado e complexo. Há certo grau de inter-relacionamento, com evidente diferenciação de percepções de qualidade e satisfação de necessidades. Compõem os tipos possíveis de clientes de um laboratório clinico: médicos, pacientes, convênios, e outras organizações.


Verifica-se que ainda existe uma significativa participação do fator humano no processo de investigação laboratorial, o que permeia a incidência de erros e independe de programas de certificação de qualidade. A garantia das boas práticas investigativas e, conseqüentemente, da acuidade de um laudo, depende, pois, de uma estrutura organizacional que fortaleça o binômio capacidade técnica e tecnologia diagnóstica.

O FLUXO DE INFORMAÇÃO NOS LABORATÓRIOS DE ANÁLISES CLÍNICAS

A informação é o principal produto de um laboratório. É o insumo que se materializa no laudo do exame, entregue aos usuários. Frente a isto, a gestão adequada é de extrema importância.


Como salienta Ogushi e Alves (1999 apud BECKER, 2004), o mais importante não é que o laboratório de análises clínicas ofereça números e índices de patologias nos resultados. Contudo, deve gerar informações de caráter vital para médicos e pacientes.


O fluxo de informações em um laboratório de análises clínicas é, em vista disso, considerado o núcleo central das atividades, em torno das quais as demais convergem. Inicia-se com a coleta de dados – tanto dados pessoais acerca do paciente, quanto à colheita da amostra biológica – e só termina com a entrega do laudo do exame (a informação final) aos usuários (BECKER, 2004).


Os autores assumem que o exame clínico-laboratorial representa o núcleo vital. O fluxo laboratorial pode ser dividido em três grandes fases que, muitas vezes, apresentam-se de forma indiferenciada e sobreposta:


§ A e B: Fase pré- análise / coleta de dados
§ C: Fase Analítica
§ D e E: Fase pós-análise / informações

A Fase A, a pré-análise, é a de cadastro, no qual os dados pessoais do usuário são fornecidos ao funcionário da recepção. Neste momento, dados – como faixa etária, sexo, o uso de medicamentos pelo paciente, exame(s) a ser(em) realizado(s) – são fornecidos ao sistema e a guia do convênio, se for o caso, ou a ordem de pagamento, é gerada.


Caso faça uso de um SI eletrônico, o laboratório pode dispor de certas vantagens. O sistema informatizado gera tanto a guia eletrônica do convênio quanto uma ordem de pagamento, e automaticamente avisa o setor técnico onde a colheita é feita. Na Fase A são apontados os testes a serem realizados e, em alguns casos, emitidas as etiquetas de código de barras para que seja providenciada a coleta do material.


A Fase B, ainda de pré-análise, é a fase da colheita das amostras biológicas para a análise patológica. Posteriormente, são quantificados em valores numéricos, isto é, em dados que servem de base à informação a ser contida no laudo do exame.


A Fase C é a analítica, pois corresponde propriamente à análise das amostras colhidas. É realizada por especialistas em patologia clínica, através de equipamentos e tecnologias específicos para cada tipo de exame. Esta fase pode ou não ser realizada no mesmo local da colheita. No geral, laboratórios pequenos a realizam em recintos adjacentes às salas de coleta. As organizações de médio e grande porte dispõem de espaços exclusivos para as coletas e um somente para o processamento das amostras. Neste caso, alguns laboratórios costumam dispor de uma Intranet, que possibilita o acesso remoto aos dados de cada usuário a partir de diferentes unidades, interconectadas em rede.


Após as análises, chega-se à Fase D, na qual a informação, o resultado do exame, é gerada a partir dos dados colhidos, previamente analisados. É comum uma nova conferência antes da expedição do laudo, que pode ser retirado pelo médico ou pelo paciente (Fase E).


As NTICs desempenham papel importante nesta fase. Os resultados podem ser entregues não apenas na forma de papeis impressos, a serem retirados no mesmo local da coleta de dados, mas também podem ser entregues via fax ou eletronicamente, através de correio eletrônico ou da página do laboratório na Internet, acessada mediante a uma senha fornecida ao paciente.


Evidencia-se, assim, que as operações de um laboratório clínico giram em torno do fluxo de dados e informações, sendo os fluxos informacionais os insumos a serem geridos. A gestão qualitativa da informação deve se iniciar com a coleta de dados – incluindo o cadastro do paciente e a coleta de amostra biológica – e culminar na emissão da informação, o laudo técnico.

IMPLICAÇÕES DO USO DA TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO PARA OS LABORATÓRIOS DE ANÁLISES CLÍNICAS

Acerca da importância que as NTICs podem ter para a gestão qualitativa de um laboratório, assim como seu funcionamento exponencial e lucratividade, referenda-se ao estudo de Oliveira e Proença (2004). Embora primordialmente os autores afirmem que o crescimento deste segmento, a partir da década de 90, esteja diretamente ligado ao crescimento e emergência dos planos de saúde privados (à privatização em saúde), acabam por demonstrar a relevância do uso das NTICs na gestão de um laboratório e as implicações desta para a gestão qualitativa.


O aumento da capacidade das instalações e a informatização/automatização tiveram papel primordial para o laboratório de análises clínicas conseguir operar nesta nova dimensão. A mudança de sede foi primordial, possibilitando ao laboratório de análises clínicas operar com número de exames mais elevados e obter espaço para novos equipamentos, possibilitando a automatização dos processos. (OLIVEIRA; PROENÇA, 2004, p.06).

Os autores enfatizam, pois, a relevância das NTICs, o próprio processo de informatização, para o crescimento de um laboratório. Demonstram, também, como as tecnologias da informação são fundamentais para o crescimento de um laboratório, pois viabilizam as possibilidades de expansão.


O primeiro passo para melhoria dos processos do laboratório é, na concepção de Oliveira e Proença (2004), o desenvolvimento de um SI informatizado. Sem um sistema que auxilie o processo principal torna-se quase inviável lidar com grandes volumes de informação.


Apesar do estudo citado pelos autores pautar-se em uma experiência isolada, os autores sugerem que o SI tende a proporcionar aumento na segurança, na qualidade e na agilidade dos procedimentos laboratoriais. A justificativa reside no fato do SI possibilitar a integração entre redes e por possuir facilidades de interação on-line e real time entre os funcionários, dirigentes, farmacêuticos, administradores, técnicos e auxiliares, ou seja, todo o corpo clínico e administrativo.


Outrossim, Oliveira e Proença (2004) comentam que o uso pioneiro de entregas de exames e laudos, via Internet ou fax, propicia ao laboratório vantagem competitiva.


Os laboratórios e hospitais (e mesmo clínicas e consultórios) podem usar a Internet e a tecnologia de rede (Intranet) para conduzir eletronicamente os processos e trabalhos, integrando, em todas as instâncias procedimentos internos de modo a facilitar e agilizar a troca de informações entre profissionais, setores e organizações.


Em laboratórios de grande porte, o fluxo de informação é controlado por aplicações tecnológicas desde a entrada do solicitante do exame. O SI destas organizações é concebido de modo a aplicar o que há de mais moderno em tecnologia da informação – como interfaces gráficas de alta produtividade e simplicidade, Internet, Intranet e arquitetura multicamadas com banco de dados relacional.


Uma das contribuições das NTICs é o desenvolvimento de softwares específicos para o aumento da produtividade, precisão, segurança e, acima de tudo, para oferecer aos clientes serviços de excelência. Deste modo, o fluxo interno de informação é agilizado e se aufere ganhos de qualidade pela otimização dos procedimentos. Através de sistemas informativos o pedido pode ser controlado desde a solicitação na recepção do laboratório até a emissão do laudo.


As NTICs entremeiam a instalação de um fluxo eletrônico interno de informação que em muito pode contribuir aos procedimentos, substituindo o papelório, fichas e prontuários por elementos como código de barras em todas as amostras primárias ou secundárias, histórico de clientes disponíveis em Intranet, parametrização de processos e layouts, rastreabilidade absoluta dos exames e interface eletrônica segura. Desta forma, são potenciais ferramentas capazes não só de aumentar a produtividade, precisão, segurança, mas, acima de tudo, de oferecer aos usuários dos laboratórios serviços de excelência e a otimização do acesso às informações.


Veiculados pela Internet ou por fax, os resultados dos exames dinamizam o fluxo de informação externo do laboratório e incrementam o relacionamento do laboratório com os usuários.


As NTICs são um poderoso instrumento para se alcançar vantagens competitivas, fidelizar a clientela e reduzir os custos. A partir do referencial tecnológico, os laboratórios podem alcançar vantagens ao aperfeiçoar a estrutura organizacional, na medida em que o aprendizado organizacional possibilita a personalização dos serviços, o que gera fidelização.


O uso das NTICs no segmento de análises clínicas está por ser avaliado, na medida em que deu início a um novo paradigma, apesar do processo de informatização da saúde está em curso. Não se pode ainda prever plenamente os resultados, pois só nos últimos anos é que algumas das dificuldades iniciais começaram a ser superadas. Contudo o processo é bilateralmente dinâmico, pois tanto a tecnologia quanto o conhecimento médico estão em evolução e se complementam.


REFERÊNCIAS

ALVIM, Paulo César Rezende de Carvalho. “O papel da informação no processo de capacitação tecnológica das micro e pequenas empresas”. In: Revista Ciência da Informação, Brasília, v. 27, n. 1, p. 28-35, jan./abr.
BECKER, A. A. A gestão do laboratório de análises clínicas por meio de indicadores de desempenho através da utilização do balanced scorecard. Porto Alegre: Programa de Pós-graduação em engenharia/ UFRGS, 2004 (dissertação de Mestrado). Disponível em . Acessado em 10 de Dezembro de 2004.
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